11 dezembro, 2006

Subúrbio, por Chico Buarque

Lá não figura no mapa. No avesso da montanha, é labirinto, é contra-senha, é cara a tapa.
Casas sem cor. Ruas de pó, cidade que não se pinta, que é sem vaidade.
Lá não tem moças douradas expostas, andam nus pelas quebradas teus exus.
Não tem turistas. Não sai foto nas revistas.
Lá tem Jesus. E está de costas!


Espalha a tua voz nos arredores, carrega a tua cruz e os teus tambores. Vai, faz ouvir os acordes do choro-canção. Traz as cabrochas e a roda de samba. Dança teu funk, o rock, forró, pagode, reggae, teu hip-hop, fala na língua do rap.
Fala no pé, dá uma idéia naquela que te sombreia.
Desbanca a outra, a tal que abusa de ser tão maravilhosa.

Lá não tem claro-escuro, a luz é dura, a chapa é quente.
Que futuro tem aquela gente toda?
Perdido em ti eu ando em roda.
É pau, é pedra, é fim de linha.
É lenha, é fogo, é foda!

28 novembro, 2006

A Aventura de um acensorista

Antônio F. trabalhava num destes prédios públicos de arquitetura antiquada no centro da capital. Exercia uma função cada vez mais rara, era ascensorista, de uniforme com corda atravessada, luvas, quepe e tudo mais. O elevador antigo exigia trabalho, e só alguém com a experiência e a paciência de Antônio podia exercer aquela função. E além do mais tinha de lidar diariamente com as caras fechadas dos funcionários que entravam e saiam do seu elevador. Não muito diferente eram as outras pessoas que vinham ao departamento sempre buscando a resolução de problemas que nunca eram resolvidos.


Já tinha uma idade avançada para pensar numa mudança de carreira, nos seus planos próximos estava sim uma aposentadoria. Passaria a viver tranqüilamente, pescando na beira do rio da cidadezinha onde nasceu. Há muito não havia grandes emoções no seu trabalho, o qual fazia mecanicamente. Ao chegar tirava do armário o uniforme grená e dourado, trocava a roupa ordinária que vestia desde casa, botando depois cada peça no armário com cuidado para não amarrotar. Sentava no seu banquinho e geralmente esperava uns 15 minutos, sozinho naquele cubículo, até o primeiro grupo chegar para o trabalho diário, eram uns subordinados que trabalhavam no sexto andar. Os mais importantes trabalhavam nos andares mais altos e chegavam bem mais tarde (e saiam bem mais cedo), os funcionários mais inferiores trabalhavam nos primeiros andares, e chegavam mais ou menos na mesma hora que Antônio, mas não usavam o elevador, subiam de escada. Embora trabalhando há muitos anos ali, Antônio não mantinha um relacionamento mais intenso com nenhum funcionário. Isso se devia a sua personalidade, desde criança era muito ensimesmado, por vezes até desconfiado. Mas os poucos que tiveram a sorte de conhecê-lo a fundo, fizeram nele um bom amigo, fiel e companheiro. Nunca fora casado, uns namoricos aqui e ali na juventude e só.


Num dia que não parecia ter nada de diferente dos demais, exceto pelo fato de ter cortado o cabelo no dia anterior – o que fazia Antônio sentir-se particularmente de bem consigo mesmo – parou no térreo abriu a porta e disse:


– Sobe.


– 14, por favor. – e o pedido veio acompanhado de um perfume que lhe arrebatou a alma.


Levantou a cabeça, mas como a aba do quepe lhe diminuía o campo de visão só viu um belo par de pernas muito brancas e grossas, num vestido vermelho não tão justo mas o bastante para ver bem o desenho de quadris largos e meneantes. Ajeitou o quepe e viu seu rosto pela primeira vez, era uma dama de meia idade, morena e bela. Ela já tinha parado e se postado elegantemente, frente à porta mirando reto e segurando contra os seios fartos uma pequena bolsa de couro marrom. Já tinha visto várias mulheres interessantes nos seus anos como ascensorista, mas nada que se comparasse a ela.


Antônio seguiu a viagem, com três paradas até o décimo-quarto andar, com o corpo rijo, como se um líquido denso e gelado se espalhasse por cada vão de seu ventre, o coração palpitante e as mãos suando dentro das luvas brancas, encardidas e gastas pelo uso excessivo. Contudo a sensação era boa, como há tempos não experimentava. No décimo-quarto ela desceu sem dizer uma palavra, Antônio observou seu caminhar compassado até ela se perder à sua direita. Já chamavam o elevador embaixo, mas o ascensorista quedou ali alguns bons segundos, não pensando em nada e curtindo a sensação que a visão daquela mulher lhe propiciara.


Então, cada vez que chamavam o elevador Antônio esperava ansioso que fosse para o décimo-quarto andar. Não demorou muito, ela desceu poucos minutos depois, veio acompanhada de dois senhores de terno, só eles falavam, ela parecia desinteressada. Antônio não prestou atenção em uma palavra do que diziam, se concentrou na mulher que tinha o olhar parado em um ponto indefinido, o que dava a ela uma força que fazia tremer o corpo de Antônio. Saiu entre os dois homens, mais uma vez em silêncio.


O resto do dia Antônio passou avoado, por vezes lembrando do som caudaloso da voz da mulher, ora sentindo na sua mente o cheiro que lhe causava tão boa sensação. Ao fim do expediente Antônio F. seguiu para sua pequena casa num bairro antigo da capital, com sua roupa pouco adequada ao frio que começava a fazer, mas pouco importava, o caminho nunca lhe pareceu tão iluminado, tudo tinha uma cor diferente, se perdia observando as coisas ao redor e não teve tempo para sentir frio.


Deitado na cama de barriga para cima quis dormir e não conseguiu, queria sonhar com ela. Por fim conseguiu adormecer, mas ao despertar constatou não sem ressentimento que a mulher do 14 não tinha participado dos seus sonhos. Foi para o trabalho, esperançoso de voltar a vê-la. Tentava manter o sentimento do dia anterior, não foi tão fácil, a realidade fazia esvair sua plenitude. Neste dia não a viu, nem no seguinte, nem no outro. Diminuía em si o fogo ascendido por aquela singular dama. Não chegou a comentar com ninguém sobre o que passou, pensava que palavras não seriam fiéis, nem à mulher, nem a seu sentimento. Passou o fim de semana. E a vida de Antônio voltava aos poucos ao seu ritmo monótono costumeiro.


Foi na outra quarta-feira, distraído no seu banquinho, a esperar no térreo, de portas abertas, que alguém quisesse subir, que Antônio a viu no começo do hall. Vestia agora azul, mas não restava dúvida, era ela. Desta vez Antônio sentiu primeiro o perfume, que bastou para acionar toda complexa gama de sentimentos que procurou retomar por toda a semana.


– 14, por favor. – e sua voz parecia ainda mais bela e envolvente.


Desta vez subiram sozinhos, sem fazer paradas nos andares intermediários, Antônio passou todo o tempo olhando intermitentemente para ela, de soslaio, e pensava em algo que poderia lhe dizer. “Frio hoje, hem?”, “O prédio está vazio hoje, não é verdade?”, “Que belo jogo o de ontem, não achou?”, “Esperei por você a semana inteira, pensei que não fosse mais voltar.”, “A senhora é a mulher mais bela que já vi em toda minha vida.” O elevador parou no 14. Ela se aproximara da porta, tinha o nariz adunco a menos de um palmo da estrutura metálica que súbito se abriu, foi dando um passo para sair e Antônio disse em voz tímida, mas doce:


– Boa tarde.


Respondeu em movimento com um aceno de cabeça e um “Boa ta…” que se perdeu no corredor. Para Antônio foi satisfatório, se sentia bem. Na saída ela pela primeira vez agradeceu, um “obrigada” simples e amável, que deixava no ar seu perfume inigualável. E esta passou a ser a rotina, toda quarta-feira entrava, pedia o 14, saia, dizia obrigada. E Antônio se rejubilava a cada semana. Passou a esperar este dia como uma criança que espera o Natal e seus presentes. Tornou-se vaidoso como nunca antes, cuidava sempre dos cabelos, a barba jamais estava por fazer, passou a usar um perfume que de muito caro não podia esbanjar. Então só se perfumava às quartas, para ela, cujo nome nunca foi capaz de descobrir. Era melhor assim, afinal de contas já lhe tinha dado um nome, que julgava mais adequado que qualquer outro registro oficial. Quando pensava nela, pensava em Regina.


Foi assim semana após semana. Certa vez Antônio programou sua pausa da tarde para coincidir com a saída de Regina, para assim poder segui-la. Deixou-a no décimo-quarto, desceu e em vez de tomar seu café com pão, se plantou na porta do edifício esperando que ela passasse. Esperou os quinze minutos que lhe cabiam de intervalo, e depois mais cinco, e teve de voltar, ao chamado do zelador que o substituía na operação do elevador e já estava impaciente com aquele serviço tão metódico. Não voltou a tentar, decidiu que devia preservar Regina naquele mundo específico, qualquer informação exterior destruiria o castelo que havia erguido. Com Regina, Antônio se tornou um homem melhor se abriu mais para o contato humano, rejuvenesceu.


Uma noite sonhou, que ao subir com ela o elevador parava por causa de uma pane qualquer. Ali naquela clausura forçada, se descobriam almas gêmeas, tinham afinidades diversas, prazeres em comum, descontentamentos parelhos. Conversaram sobre tudo, riam juntos gargalhadas de amor. Acordou empapado de suor e não pregou os olhos o resto da noite.


Passou-se não mais que três meses. Quando foi a primeira quarta-feira de agosto Regina não apareceu. Antônio pensou que estivesse doente ou que alguma coisa qualquer houvesse ocorrido, um parente enfermo, um compromisso fora da cidade. Mas ela não voltou em nenhuma quarta-feira mais, nem em nenhum outro dia. Antônio manteve as esperanças por um mês, depois caiu na real, qualquer que fosse o affaire que a trouxera ao departamento, o havia resolvido, estava livre, não precisaria nunca mais voltar àquele prédio velho e frio. Por vezes, ao ouvir o pedido “14, por favor.”, Antônio pensava consigo “Meu Deus é ela.”, mas rapidamente se apagava a ilusão.


Muito tempo depois, avançado em anos, Antônio F. pescando em frente ao seu rancho sentiu o perfume de Regina, olhou ao redor, mas não passava de uma flor singular que desabrochava no barranco à beira do rio. Sorriu.



Leonardo de Oliveira Cunha (pastiche de Italo Calvino), junho de 2006

FALA

Eu não sei dizer nada por dizer
Então eu escuto
Se você disser
tudo o que quiser
Então eu escuto
Fala
Se eu não entender, não vou responder
Então eu escuto
Eu só vou falar na hora de falar
Então eu escuto
Fala

23 novembro, 2006

07 novembro, 2006

A tecnologia em prol da nostalgia

A volta ao mundo em 80 dias

Abertura de um desenho que pouca gente viu. Pena que a música não está em português... quem se lembra? "São 80 dias, são, 80 nada mais para dar a volta ao mundo ..."

04 outubro, 2006

Francisco de Assis


Ele abriu mão de sua riqueza material. Amou os pobres, os renegados, os leprosos, a natureza, os animais. Ensinou que é mais importante amar que ser amado, que é perdoando que se é perdoado.
Como seria uma segunda vida de Francisco de Assis hoje em dia?

21 setembro, 2006

Leia... Leia!

O homem que trabalha, que minimamente ganha a vida, que leia! Leia em casa, no ônibus, no metrô. Leia naquela hora que os meios de comunicação devoram contando casos de polícia, bobagens incoerentes, mexericos e fatos muito menores, cuja confusão e abundância parecem feitas para aturdir e simplificar grosseiramente os espíritos.
Paul Valéry

08 setembro, 2006

Três cores, III

A fraternidade é multicolorida
Cores irmãs, tão diferentes por fora,
por dentro tão parecidas.
Vermelho é o sangue que nelas mora.

28 agosto, 2006

Três cores, I

A liberdade tem cor?
Se tiver, será azul, porque o azul não se prende.
No azul não há dor.
Ele, como a liberdade, é aquilo que se sente.

24 agosto, 2006

Mea culpa

Dirijo sozinho um carro que queima um litro de gasolina a cada 9 km.

Não reciclo meu lixo.

Gasto mais água do que precisaria ou deveria ao tomar banho, escovar os dentes, etc.

Não vejo tantos filmes nacionais.

Não lembro em que candidatos a deputado votei nas últimas eleições.

Não me articulo politicamente.

18 agosto, 2006

14 agosto, 2006

A Joey, Dee Dee e Johnny

I believe in miracles.
I believe in a better world for me and you.
I close my eyes and think how it might be.
The future's here today.
It's not too late.

10 agosto, 2006

"São raros os brasileiros dotados de liberdade substantiva, ou seja, em condições de vislumbrar alternativas para o seu projeto de vida, poder escolher uma delas e realizá-la, inclusive alterando-a parcial ou totalmente. A maioria está privada do direito à vocação e se submete à oportunidade de emprego, condenada a um trabalho que raramente se traduz em satisfação subjetiva, espiritual."
FREI BETTO

09 agosto, 2006

Ritas by leooc



É fácil dar uma de Andy Warhol na era da informática

Dicas de mãe para filho by William Shakespeare

Love all, trust a few
Do wrong to none: be able for thine enemy
Rather in power than use, and keep thy friend
Under thy own life's key: be cheque'd for silence,
But never tax’d for speech.
-All's well that ends well

Ame a todos, confie em poucos,
Não trate ninguém injustamente: faça que teus inimigos o temam
antes por sua força que pelo uso que possas fazer dela,
guarde seus amigos no peito a sete chaves:
Que seja censurado por seu silêncio,
Mas nunca condenado por suas palavras.
-Tudo bem quando termina bem

07 agosto, 2006

Sutilezas do Preto e Branco

Filme em super 8 que dirigi em 2004.

O que eu vi no FIT 2006.

Arka (Teatr Ósmego Dnia – Polônia): Plasticamente belo e grandioso.

Otra vez Marcelo (Teatro de los Andes – Bolívia): Poesia e política juntas e bem casadas como poucas vezes vi. Ainda chego lá.
*é deste espetáculo a citação da postagem anterior.

Hysteria (Grupo XIX de Teatro – São Paulo): Mais do que tudo, uma experiência.

O que seria de nós sem as coisas que não existem (Lume – Campinas): Esse pessoal é bom! Muito humano.

Saudade em terras d’água (Cie. Dos à Deux – Brasil/França): Preciosismo extremo. Tocante e universal. Técnica a serviço do sentimento. Nunca vou chegar lá.

06 agosto, 2006

04 agosto, 2006


Breve aqui o filme

Eu queria fazer um filme

Eu queria fazer um filme. Um filme inédito, mas que eu, em algum lugar, em algum tempo, já vi. O personagem principal é um; o ser humano. A trama é a essência humana, o mote é o amor. O conflito é meu conflito interno. O desfecho é a vida. Os efeitos especiais são os sentimentos humanos. Meus olhos e a câmera se misturarão. Minha mente, com imaginação, fará a edição. Os espectadores serão transformados, se tornarão melhores.

04 julho, 2006

Muro

De um só impulso chegou no topo do muro. Ficou ali em pose de bailarino por três segundos. E com uma perna apenas saltou para o outro lado. Caiu fazendo logo três rolamentos laterais e pondo-se prontamente de pé. E passou a andar calmamente, como quem passeia no parque. Só a uns trezentos metro dali, espanou com a mão a terra que tinha nas roupas. E daí a alguns segundos começou a chorar. Não emitia um som, mas muita lágrima vertia de seus olhos. Encharcou as mangas da camiseta enxugando do rosto o suor e as lágrimas. Cessou o pranto. Diminuiu o passo. Olhou para o céu, e sorriu. “Meu pai deveria estar aqui”, pensou. Quando chegou no lago já não pensava em nada. Livrou-se das roupas, e atirou-se nas águas negras e geladas, agitando-as como há muito tempo não sucedia. Secou-se a sol, deitado na grama. Vestiu-se e seguiu caminho. Com os longos e anelados cabelos ainda molhados chegou num vilarejo cheio de casas rústicas todas amarelas de telhado marrom-avermelhado. Estava perdido, girava em torno de seu próprio eixo sem saber para onde seguir. Até que no meios das dezenas de casinhas distinguiu uma, que levava ao lado da porta o numero 135 pintado de tinta verde. Correu até ela, bateu na porta. Esperou inquieto. Abriu uma senhora de cabelos cacheados cor de prata. Abraçou-a num repente, e deixou-se ficar em seus braços longos segundos. Nunca mais voltou para o lado de lá e finalmente foi feliz.


Leonardo de Oliveira Cunha

22 de março de 2006

01 junho, 2006

Top 50 ...até 1996

Fiz um novo top 50, desta vez resolvi deixar de fora os filmes realizados nos últimos dez anos. Penso que o tempo é necessário para saber o quanto uma obra é relevante ou mesmo se gosto mesmo dela. Boa parte dos filmes listados eu vi mais de uma vez, e eles funcionam a despeito da sua idade. A maioria é incontestávelmente obra de arte. Esses são os cinqüenta de hoje ainda tenho muitos filmes a ver e rever.

1-O Gabinete do Dr. Caligari - Robert Wiene, 1919

2-Em busca do ouro - Charlie Chaplin, 1925

3-O Encouraçado Potemkin - Sergei Eisenstein, 1925

4-A idade do ouro - Luis Buñuel, 1925

5-Sem novidades no front - Lewis Milestone, 1930

6-Luzes da Cidade - Charlie Chaplin, 1931

7-Diabo a quatro - Leo McCarey, 1933

8-Cidadão Kane - Orson Welles, 1941

9-Casablanca - Michael Curtiz, 1942

10- Roma, Cidade Aberta - Roberto Rossellini, 1945

11- Os melhores anos de nossas vidas - William Wyler, 1946

12- Ladrões de Bicicleta - Vittorio de Sica, 1948

13- Crepúsculo dos Deuses - Billy Wilder, 1950

14- Um bonde chamado desejo - Elia Kazan, 1951

15- Cantando na Chuva - S. Donen, G. Kelly, 1952

16- Janela Indiscreta - Alfred Hitchcock, 1954

17- Noites de Cabíria - Federico Fellini, 1957

18- Doze homens e uma sentença - Sidney Lumet, 1957

19- A marca da maldade - Orson Welles, 1958

20- Quanto mais quente melhor - Billy Wilder, 1959

21- Os Incompreendidos - François Truffaut, 1959

22- Psicose - Alfred Hitchcock, 1960

23- La Dolce Vita - Federico Fellini, 1960

24- Acossado - Jean Luc Godard, 1960

25- O pagador de promessas - Anselmo Duarte, 1962

26- O Anjo Exterminador - Luis Buñuel, 1962

27- Deus e o Diabo na Terra do Sol - Glauber Rocha, 1964

28- A primeira noite de um homem - Mike Nichols, 1967

29- 2001, uma odisséia no espaço - Stanley Kubrick, 1968

30- Perdidos na noite - John Schlesinger, 1969

31- Laranja Mecânica - Stanley Kubrick, 1971

32- Gritos e Sussurros - Ingmar Bergman, 1972

33- O Poderoso Chefão - Francis Ford Coppola, 1972

34- O Poderoso Chefão-Parte II -Francis Ford Coppola,1974

35- Um dia de cão - Sidney Lumet, 1975

36- Um estranho no ninho - Milos Forman, 1975

37- Taxi Driver - Martin Scorsese, 1976

38- Annie Hall - Woody Allen, 1977

39- Manhattan - Woody Allen, 1979

40- Rock 'n' Roll High School - Allan Arkush, 1979

41- Touro Indomável - Martin Scorsese, 1980

42- Tootsie - Sidney Pollack, 1982

43- Scarface - Brian de Palma, 1983

44- O Baile - Ettore Scola, 1984

45- Asas do desejo - Win Wenders, 1987

46- A dupla vida de Veronique - Krzysztof Kieslowski, 1991

47- A Liberdade é Azul - Krzysztof Kieslowski, 1993

48- A Igualdade é Branca - Krzysztof Kieslowski, 1993

49- A Fraternidade é Vermelha - Krzysztof Kieslowski, 1994

50- Mallrats - Kevin Smith, 1995

02 maio, 2006

NADA

Nada. O que? Nada! Virou-se e foi embora. Três dias depois estava de volta. Desta vez estava mais sereno. O casaco pesado lhe dava uma aparência séria, destoante do clima informal e desleixado de seu all-star sujo e furado. Seu olhar estava cheio de sonhos, tão cheio que parecia estar preocupado, mas já havia passado desta fase, agora só vislumbrava os possíveis porvires, sem medo. No espelho lateral viu seu rosto e se descobriu uma pessoa diferente. Lembrou-se de seu pai, se distraiu em pensamentos e só voltou à realidade quando ela chegou. Pela primeira vez em semanas se abraçaram, e pela primeira vez por iniciativa exclusivamente dele. Ela gostou. Seguiu-se ao abraço uma troca de olhar prolongada, cuja duração não pode ser medida, pois nessas situações cada um tem sua percepção própria do tempo. Ela estava vestida somente com uma camisa de malha gasta e confortável, suficiente para a decência. Levava os cabelos desgrenhados, os olhos inchados, como de quem chorara ou acabara de acordar. Fizera as duas coisas. Ele não percebeu, apenas via nos olhos dela o pedacinho de alma, que Deus deixou amostra quando criou o homem. Ele respirou fundo e com a expiração soltou, E aí? Veio hoje à noite, respondeu ela sem pausa. Não se disse mais nada. Ele largou seu corpo e agachado chorou. Ela se aproximou tocou-lhe na cabeça. Ele enlaçou com os braços suas coxas e recostou a cabeça no ventre dela. Foi segundo momento de maior intimidade dos dois.

Leonardo de Oliveira Cunha

16 de maio de 2005

26 abril, 2006

Onde está nossa culpa?

Onde está nossa culpa? Nascemos com culpa de algo que não fizemos. Temos a culpa e somos vítimas, não obstante. Ostentamos luxos desnecessários, - que luxo é necessário?. Não desenvolvemos a verdadeira consciência e somos nós quem a deveria ter, pois tivemos e temos as condições para tanto. Comida, moradia, educação. E os agentes de alienação são ainda mais fortes e uma maioria nem consegue ver além, outros tantos vêem mas não agem. Ignorância é culpa, omissão é culpa. Nosso sistema é atroz, desumano. E cento e poucos anos de história nos fazem crer que não há outra alternativa, que é assim porque deve ser assim e nada se pode fazer. A mudança deve ser profunda e sistemática, mas é possível. Podemos e temos medo de saber que o poder está conosco. Na união, na miscigenação, está a solução. Se ainda discriminamos cor, como querer aprofundamento em questões mais complexas. Se não aceitamos crenças diversas, como pensar além. Somos inconseqüentes ao buscar diversão em algo ilícito, que ao comprarmos financiamos miséria, violência, dor, morte. As grandes companhias lucram com cigarro, álcool, petróleo, aço, refrigerante, tênis, sob o suor de trabalhadores mal remunerados, que não são nem ao menos capazes de adquirir o que produzem. E a publicidade alimenta sonhos, desejos, irreais, que só fazem aumentar as diferenças. A diferença entre ricos e pobres, entre querer e poder. Necessidade e desejo se confundem perigosamente. Temos medo de transmitir nossa indignação, não passamos para o próximo a vontade de mudança.


Leonardo de Oliveira Cunha, 8 de setembro de 2005.

07 março, 2006

O Preconceito e a Indústria

Um filme se destacou na produção industrial Hollywoodiana em 2005. Seu destaque não se deveu ao fato de ter atingindo valores vultosos nas bilheterias, antes pelo contrário. Sua arrecadação no seu país de origem foi modesta e pelo Brasil passou quase despercebido, ficou em Belo Horizonte pouquíssimo tempo em cartaz e nas salas ditas alternativas. Bem, isso não é tão improvável dado que é o primeiro filme do diretor Paul Haggis, embora também, ele tenha juntado um elenco de categoria com nomes como Don Cheadle, Matt Dillon, Sandra Bullock, Brendan Fraser, todos em ótimas performances. E um dos motivos do seu destaque é justamente este, um diretor iniciante logrou fazer um filme consistente, tanto na forma como no conteúdo e obteve de seus atores – vários aliás e com participação bem equilibrada – um resultado invejável.


O filme é Crash, que no Brasil ganhou o subtítulo (contestável como de costume) – No Limite. Ele segue a tradição de filmes como Short Cuts, Nashvile, ou os recentes, Magnolia e 21 Gramas, e mistura no ambiente urbano de Los Angeles, pelo menos, cinco histórias com seus personagens e subtramas. Tudo isso para mostrar a diversidade da formação do povo americano, com os negros, os orientais, os libaneses, os latinos, e como os diferentes núcleos não conseguem se comunicar e se entender barrados pelo preconceito, pela hostilidade, pela intolerância, pelo medo. O filme e seu diretor conseguem mostrar que este preconceito de fato existe, por mais mascarado que possa ser, e ele não é em si justificável, tampouco recriminável. Ele mostra seres humanos ambíguos, susceptíveis a atitudes diametralmente opostas de um momento para outro. Como o mais canalha e racista oficial de polícia que mostra seu lado humano ao cuidar do pai doente, ou ao salvar a mesma mulher que havia agredido. É mesmo neste ponto que está sua maior qualidade e seu maior defeito, quando chega a forçar o enredo para mostrar estes dois lados de todos os personagens. Num dado momento da projeção se tem a impressão de que tudo vai sempre acabar muito bem, no mais americano happy end, por sorte da fita um episódio desfaz essa sensação. Independente de aspectos isolados, Crash é um grande filme, o Brasil precisa de um Crash para desmascarar nossos diversos preconceitos tão velados em todos os níveis.

O segundo aspecto que chama a atenção em Crash – No Limite é sua relação com a indústria norte-americana de cinema e sua máquina de marketing. A Paul Haggis só foi possível ter seu debut num filme de tal envergadura por ter sido indicado ao Oscar de Roteiro Adaptado por Menina de Ouro ano passado. Pode-se dizer que o prêmio não tem relevância artística, mas sua importância para indústria é patente. O Oscar dá visibilidade, e abre portas. Sendo – de certa forma até surpreendentemente – indicado a cinco estatuetas incluindo melhor filme, Crash teve o empurrão que precisava, que só esta forte indústria poderia dar. Crash volta às salas de cinema no Brasil em 17 de fevereiro, e com certeza alguns milhões mais de dólares entrarão na sua bilheteria doméstica. Uma indústria assim e todo seu aparato de marketing seriam bem vindos também no Brasil, trazendo mais auto-estima, mais incentivo à produção, e maior chamarisco para o público local. Aqui um filme ganha o nosso festival mais prestigiado – Gramado –  e demora mais de um ano para ser lançado comercialmente, e quando o é fica timidamente em algumas poucas salas e por curto tempo.

Leonardo OCunha

10 de fevereiro de 2006

08 fevereiro, 2006

Feliz, tadinho

Era um sujeito tão feliz que dava dó. É. Porque sua felicidade era boba, vã, ingênua. As pessoas o viam e diziam, Tão bonzinho tadinho. Era feliz assim porque via a vida com mais cores, mais música. A realidade dura não lhe afetava. Amolecia tudo com sua percepção ímpar. Quando criança não era assim, era como todas as crianças, brincava, brigava, chorava. Pela época da adolescência que sua maneira singular começou a se desenhar. Lia muito por este tempo, agora já não lê nada. Não precisa.

Num dia sem nuvens ou numa noite sem lua, já não se sabe, ele subiu ao céu. Não era deus, nem santo, mas era sonhador o os sonhos nos dão asas, e com elas voou. Ao infinito se dirigiu com um sorriso no rosto e nunca mais voltou. Foi Feliz!



21 de julho, 2005

15 janeiro, 2006

Socorro, Teatro, me socorra!

Socorro
Teatro, me socorra!


Durmo,  me acorde
Estou com preguiça, me dê vergonha
Estou cansado, me erga
Estou indiferente, me bata
Continuo indiferente, me quebre a cara
Tenho medo, me dê coragem
Sou monstruoso, me humanize
Não sonho mais, me chame de fraco e imbecil
Esqueci, lance sobre mim a Memória
Estou triste, vai buscar a alegria
Estou cego, convoque todas as Luzes
Fui recrutado pelo Ódio, dê todas as forças ao Amor.


Adapatação minha para um discurso da Arianne Mouchikin